04 janeiro, 2008

 

A ausência do poder público

Por Luiz Ernesto

É interessante como as pessoas estão se acostumando e se adaptando às situações de conviver sem o poder publico para lhe prestar o serviço que lhe é devido.
Dia desses, em uma festividade de final de ano numa conversa informal sobre o nosso dia a dia e a violência, um dos participantes da prosa, indagou do proprietário da residência onde nos encontrávamos (bairro de classe média) se havia melhorado o problema da segurança e do barulho com a construção do muro mais alto.
Então, o mesmo informou-nos que na esquina ali ao lado da sua casa havia uma padaria/mercearia que era ponto de venda de drogas e que o proprietário da mesma mantinha o som do estabelecimento nas alturas até tarde da noite perturbando a vizinhança. O nosso anfitrião nos disse então que depois de algumas denuncias, não obtendo a resposta do poder público, havia deixado de mãoaté por que o individuo era tido por todos como o bam bam bamda área e que ademais depois que aquele individuo instalara-se com seu estabelecimento comercial no bairro, os roubos e furtos praticamente acabaram, por que ele controlava toda a malandragemdo bairro.
Outro participante da prosa interveio e indagou por que então ele não se mudava dali para um outro bairro mais seguro?Ele disse que estava pensando nisso e que era só uma questão de tempo. Outro também aproveitou para opinar afirmando que ele estava certo, que o melhor mesmo era ele se mudar.
Depois de ouvir todos os argumentos e já ansioso por dar o meu pitaco na conversa, entrei de sola e tasquei:Por que vocês todos do bairro não se reúnem e não levam o caso às autoridades e cobram das mesmas a solução do problema? Vocês acham que levantando muros, colocando grades, ou mudando-se de bairro todas as vezes que forem incomodados vai resolver o problema? Todos me olharam e um deles transmitiu o pensamento dos demais como se estivessem a dizer: “isso não dá em nada”.
Definimos “violência”, de forma sintética, como todas as práticas sociais, inclusive as simbólicas, que viola a dignidade do ser humano, como indivíduo e como grupo.A progressiva incorporação do medo e da insegurança como componente fundamental da existência cotidiana na cidade é uma verdade nua e crua.
A partir deste fato, podemos concluir que a incapacidade do Estado constitui-se, então, em uma das principais razões para que a insegurança tanto para morar como de circular torne-se sentimento comum entre os cidadãos.
Isso acontece porque a ausência do poder público incentiva o aparecimento de grupos privados que disputam a soberania e o “mando” nos diversos espaços públicos e privados das nossas cidades.A legitimação do poder não é produto da força, mas o reconhecimento da capacidade de definir normas e fazê-las serem cumpridas.
Permanecer é o desafio, temos que resistir: O Estado não consegue regular as relações de propriedade; afastar da vida social aqueles e/ou responsabilizar os que não respeitam as suas leis; garantir a segurança dos cidadãos; controlar a oferta dos serviços públicos e o funcionamento dos equipamentos urbanos.
A inapetência do Estado por exercer a soberania e regular as relações das pessoas e grupos estabelecidas numa determinada região ou território fez com que essa forma de exercício do poder fosse privatizada. Assim, o poder de ordenar as práticas sociais em um território específico passou a ser disputado por grupos privados criminosos, hoje conhecidos “tráfico de drogas” e “milícias”.
O objetivo central desses grupos é, via o controle do território, desenvolver um conjunto de ações econômicas lucrativas através da venda de produtos diversos: drogas, armas, terrenos, segurança etc.É necessário que o poder público e sociedade civil reflitam a opção de adotar o enfretamento com estes grupos privados, como política de segurança pública, para a recuperação da soberania nos espaços privados e públicos por parte do Estado.
O direito à segurança, à vida, é uma premissa fundamental da existência coletiva. Podemos viver numa sociedade injusta, embora insatisfeito, mas não podemos viver em uma sociedade sem ordenação coletiva, onde cada um faça apenas o que quer, sem reconhecimento e respeito ao outro.
Fiquei a pensar se então aquele caso que estávamos vivenciando naquela conversa, não era o prenuncio da mesma situação na querida cidade em que nasci, cresci e hoje crio meus filhos e netos.Se neste caso, o Estado não for por nós quem o será?
Com certeza, esta omissão do poder público, anuncia sim uma guerra entre irmãos do tipo cada um per si e Deus por todos! Salve-se quem puder! Temos que resistir!

Luiz Ernesto é cuiabano, funcionário público aposentado é diretor de Comunicação da Afemat (Associação dos Funcionários da Fazenda de MT





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